domingo, abril 05, 2009

o grande circo místico II - sobre todas as coisas




Sobre todas as coisas
Edu Lobo - Chico Buarque/1982
Para o balé O grande circo místico
Ilustração de Naum Alves de Souza




Pelo amor de Deus
Não vê que isso é pecado, desprezar quem lhe quer bem
Não vê que Deus até fica zangado vendo alguém
Abandonado pelo amor de Deus
Ao Nosso Senhor
Pergunte se Ele produziu nas trevas o esplendor
Se tudo foi criado - o macho, a fêmea, o bicho, a flor
Criado pra adorar o Criador

E se o Criador
Inventou a criatura por favor
Se do barro fez alguém com tanto amor
Para amar Nosso Senhor

Não, Nosso Senhor
Não há de ter lançado em movimento terra e céu
Estrelas percorrendo o firmamento em carrossel
Pra circular em torno ao Criador
Ou será que o deus
Que criou nosso desejo é tão cruel
Mostra os vales onde jorra o leite e o mel
E esses vales são de Deus

Pelo amor de Deus
Não vê que isso é pecado, desprezar quem lhe quer bem
Não vê que Deus até fica zangado vendo alguém
Abandonado pelo amor de Deus

*

De quando em vez sinto a fé a abandonar-me devagar, pela ponta dos dedos, como fios que se derramam na terra. Penso para onde ela vai, e é curioso que nunca pense de onde ela vem. Nunca a sinto chegar, acordo um dia e está lá, como nunca estivera, recém-nascida. A outra que perdi não é a mesma. Agora o que custa mesmo é o tempo que vai de uma à outra, esse tempo não escorre, e faz pensar que se calhar nunca se teve fé, mas sim encontros com ela. Encontros casuais.

4 comentários:

WFox disse...

Tudo aquilo que fazes de bem, voluntariamente, pelo teu próximo é fruto da fé....
Ele deu-nos livre arbitrio, num jardim de eden, onde nós humanos podemos viver comunitariamente...infelizmente há alguns entre a raça humana, que usurpam com o seu egoismo , partes deste "jardim" para seu usufruto pessoal... a fé ou o "sopro de deus" só o sentimos quando fazemos da nossa vida um lugar ausente de egoismos....
por vezes é no deserto que ouvimos melhor o que Ele nos tem a dizer...
e em regra há muito para "escutar"...o homem sem Fé é uma pedra oca.

gambozino disse...

Raposo/a: A fé que eu perco não é essa, essa é mais ou menos constante, as fés que me acabam, começam, acabam, começam, são outras: a fé no ser humano e nas suas instituições que pervertem o verdadeiro sentido das coisas; a fé no amor; a fé na felicidade: "o melhor meio para alcançar a felicidade é contribuíndo para a dos outros" - é bonito porque é verdade, ou é verdade porque é bonito? Se só olhamos e cuidamos dos outros esquecemo-nos de olhar por nós, não é?

WFox disse...

“a fé no ser humano”

Existem pessoas que pelos seus actos pervertem o “sentido das coisas”, a essas devemos fazer sentir que vão pelo caminho errado…mas se o seu norte não muda, batemos as nossas sandálias e dirigimo-nos para “outra aldeia”…

Existem pessoas admiráveis …que através dos seus exemplos de vida, nos obrigam a acreditar que a bondade não morreu e que a vida faz sentido…a essas vale a pena “sentarmo-nos no chão” e “beber” o seu testemunho …
Estes ajudam-nos a entender, que é possível mudar….
Poderás dizer…mas nem sempre as vejo…pois é verdade, mas não desistas pois se o firmemente “pedires”, algures as vislumbrarás.

“ instituições que pervertem o verdadeiro sentido das coisas “

Sim é verdade, mas as instituições são feitas pelas pessoas e tudo depende de como elas vivem e sentem a “missão” da organização. O “tempo” ditará as que sobrevivem e as que morrem….O importante é não nos deixarmos deslizar na corrente, mas remarmos convictos que a nossa barca deve ir de encontro ao “verdadeiro sentido das coisas”….por vezes pagam-se preços bem altos, mas se acreditarmos só nas nossas forças, vamos ao fundo rapidamente….é nesta altura que se pedires “ajuda a Alguém” ele faz -te forte, para não soçobrar em tanto redemoinho….
O tempo ditará o que sobrevive e o que morre….

“a fé no amor”

Existe e não tenhas dúvidas …. Existe também muito DESAMOR, mas desse já muito se sabe….
Se em algum momento sentires que é com aquela que gostarias de ficar,estar, permanecer, criar, olhar, ouvir, sentir e que de uma forma irracional , este sentimento perdura no tempo e regressa de forma incontrolada….são alguns dos indícios de que o Amor existe…! Isto implica ir á luta e não deixar apagar este impulso natural…!
Não conheces ninguém que se AMA?

"o melhor meio para alcançar a felicidade é contribuindo para a dos outros" - é bonito porque é verdade, ou é verdade porque é bonito?

Infelizmente tens razão, muitos de nós papagueamos frases bonitas, politicamente correctas, mas que não espelham nada do que se faz….
Com facilidade perdemos o “sentido das coisas”, na voracidade de fazer coisas, aparentemente boas. Por vezes até os fins justificam os meios….e de repente perdemos o norte ….

Já alguma vez contribuíste para a desgraça de outros? Que sentimento lá no fundo surgiu? Quem consiga obter prazer na desgraça alheia , só pode ser doente ou deixou há muito de ter um “coração consciente”.

Há quem confunda o prazer com a Felicidade.
O prazer é momentâneo , por vezes um acto de consumo isolado e pode-nos criar dependências…a Felicidade é um estado que se vai obtendo, quando se sente vontade de dar, sem procurar receber em troca…
É difícil e por vezes aparentemente ingrato, mas o caminho é por ai….

Darmo-nos sem ser á toa e com sentido…
Por vezes gastamo-nos em “ofertas” absurdas, que os outros não querem e isso nada acrescenta de mais valia á Vida dos outros….é um beco sem saída.
“Oferecer leite em pó a quem não tem água potável…”
Devemos estar atentos ao que os outros necessitam…se não nesta encruzilhada surge o desalento…

“Para que o mal vença, basta que os homens de bem fiquem de braços cruzados”. Edmund Burke (1729-1797)


Se só olhamos e cuidamos dos outros esquecemo-nos de olhar por nós, não é?

Para que cuides dos outros de forma benigna, vais ter que preocupar contigo também...pois ninguém pode dar aquilo que não possui. Mas acredita que te será dado e providenciado, quanto mais tu te descentrares do teu ego. O equilíbrio surge por natureza, quando o objectivo é olhar pelo próximo!
Até um dia
WFox

WFox disse...

- 1 Oásis de gente que procura O BEM !


Fundäo, Castelo Branco, 13 Abr (Lusa) - Centenas de pessoas de todo
o mundo em busca de paz de espírito já passaram pelo Monte dos Carvalhos,
no sopé da Serra da Gardunha, onde näo há electricidade e se vive em tendas
ou construçöes naturais.

"A visäo para este lugar é de uma comunidade monástica", onde se abdica
dos valores individuais, "com equilíbrio entre oraçäo, trabalho, convívio
e descanso", descreve Bárbara Leite, 34 anos, umas das fundadoras.

Segue os princípios cristäos e já recebeu amigos de todos os credos
que conheceu ao calcorrear o globo, antes de se fixar perto da Póvoa da
Atalaia, há dois anos e meio. Desde entäo säo uma dúzia, outras vezes mais.
"Uns passam aqui dias, outros meses. Nunca estou sozinha", refere.

Antonius Snellart, holandês de 53 anos, é um dos residentes dos últimos
tempos. Ele e Bárbara têm amigos em comum que o levaram a conhecer o Monte
dos Carvalhos - onde o inglês é a língua predominante.

Instalou-se depois de uma experiência "chocante" de 11 anos no combate
à pobreza na ïndia.

"Salvar moribundos à beira de estrada näo chega. Depois daquilo só queremos
uma vida simples, porque só assim se podem ajudar os pobres", procurando
um equilíbrio global, defende.

Anna Kitchen, 25 anos, vive em Manchester, na Inglaterra, onde trabalha
na Speak Network, uma rede internacional de jovens contra as injustiças
no mundo.

Chegou ao Monte dos Carvalhos com o namorado, depois de ouvir o relato
de amigos. "Viemos relaxar, passar tempo com amigos e aprender algo mais
sobre a terra e algumas plantaçöes. É uma espécie de férias", diz.

"Acho fantástico conseguir viver assim, fora da cidade. Acho que se
parece mais com a vida como ela realmente deve ser", sublinha.

A única construçäo em pedra está no centro do terreno e foi recuperada
como cozinha, com um forno a lenha, onde todos têm as suas tarefas. Em redor,
há campos cultivados, água e diferentes construçöes feitas com madeira e
outros materiais naturais - como um quarto de oraçäo.

Quem abandona a estrada nacional 18 encontra placas ao longo de quatro
quilómetros em terra batida e por entre diversas quintas até chegar ao Monte
dos Carvalhos (Mount of Oaks, em inglês, como se lê nas placas).

O mesmo caminho de ida e volta que Bárbara faz pelo menos uma vez por
semana para comprar mantimentos (sobretudo leite, ovos e vegetais). "Vamos
ao mercado do Fundäo ou às lojinhas da Póvoa da Atalaia. Apoiamos a economia
local".

"Além do mais, as pessoas conhecem-nos e convivemos bem com todos",
garante. Como atesta o facto de um vizinho ceder electricidade para carregar
o telemóvel e o computador portátil, com que acede à Internet e mantém o
seu blogue (http://shantipilgrim.blogspot.com).

Junto à cozinha está a lata mágica, onde quem por ali passa pode deixar
o seu donativo.

"Quando é preciso ir às compras, vamos buscar o que há na lata", descreve,
sendo que, em média, 50 euros por semana bastam.

Bárbara vive há 10 anos de donativos, o que encara com naturalidade,
porque diz que näo age para "proveito próprio".

"Tudo o que recebemos é para dar, näo estamos aqui para fazer dinheiro
ou para nos satisfazermos. É para dar a quem vem descansar ou em retiro.
E é um ciclo: quanto mais se dá, mais se recebe".

O Monte dos Carvalhos vive sobretudo de donativos internacionais.

"Há uma grande rede de relacionamentos global", refere, mas sem fazer
contas às doaçöes ou olhar a doadores, garante.

"Alguns já cá estiveram, outros conhecem-nos pelo blogue e vêem que
é algo de positivo".

"Outros gostavam de viver assim, mas têm empregos, família ou compromissos
e näo podem. Mas apoiam-nos".

Já este mês, o Monte dos Carvalhos acolheu duas dezenas de participantes
num curso sobre permacultura (sistemas ambientalmente sustentáveis, socialmente
justos e financeiramente viáveis) cujos princípios estäo a ser aplicados
no terreno, por exemplo, nas culturas agrícolas.

Com a chegada da Primavera, boa parte dos dias é agora dedicada a novas
construçöes, tanto aquelas onde cada um vive como as de utilizaçäo comum,
caso do quarto de oraçäo.

"Sem electricidade, vivemos com o ritmo solar", descreve Bárbara. A
noite é passada à volta da fogueira, com conversas ou música.

"Já nos perguntaram ao telefone o que fazemos à noite", recorda. As
chamadas de televendas da operadora säo frequentes para o telefone fixo,
única peça de tecnologia que ali conseguiu entrar.

"Querem vender pacotes com Internet e televisäo. Eu rio-me, respondo
que näo temos electricidade e as pessoas ficam espantadas".

Apesar do relacionamento que já existe com a populaçäo da freguesia
e o pároco local, Bárbara gostava de no futuro poder acolher visitas de
escolas ao Monte dos Carvalhos para oficinas ligadas ao meio rural.

"Construçäo com produtos naturais, permacultura e ver a vida no campo
é importante para despertar os jovens a voltar aos meios rurais. Porque
o país está a ficar desertificado", conclui.