domingo, abril 30, 2006

Erosão dos Sonhos

Quando menos se espera o vento muda, e um olhar perdido arrasta a imensidão da vida, sem esperar. Os cabelos das mulheres revoltam-se contra a solidão da espera, dos segundos que comem os minutos que fazem passar as horas e os dias, fumam cigarros a olhar o horizonte, porque cada cigarro bem fumado são cinco minutos de vida, cinco vezes sessenta segundos de voo de flamingo ao soar de um disparo. Até as putas são tristes, pois alimentam-se da tragédia dos homens sujos, são lobas à espera de presas que lhes sugam a dignidade intrínseca de não terem nascido putas, bem como a esperança de não morrerem como tal. As ondas do mar entregam cadáveres pretos à costa que lhes pertence e como se não bastasse entregam às suas famílias a arma do crime, lavada pela frescura oceânica, embrulhada como uma dádiva de enganos. Os soldados regressam às batalhas, levam tudo com eles e não trazem nada a não ser o vazio dos olhares, já mortos, baixas por confirmar. A roleta russa tende a resolver todos os conflitos, porque no fim de tudo é a sorte que comanda as operações, a sorte e a impostora da espera, que nunca realmente espera por ninguém. No fim de tudo o vento é um mero espectador das sortes que despoletou só por mudar, continua e continuará sempre a soprar e a arrastar vidas em amores e tormentos e breves e tórridas paixões. Pena que quem espere nem sempre alcançe, pena que a sabedoria popular acabe aqui, no sueste dos sonhos. 29-11-04, acerca da ante-estreia da Costa dos Múrmurios (lj gambozino-queria tê-lo aqui)

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