terça-feira, março 24, 2009

o pastor doente

"Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio."
Alberto Caeiro escreveu este verso, termina um poema dos mais bonitos, daqueles em que o pastor adoeçe porque pensa em demasia, e ainda por cima numa coisa só - está-se mesmo a ver no quê - estes poemas são desde que os li os meus predilectos do mestre pessoano, já muito escrevi sobre eles, li-os intensamente, o que não quer dizer que os tenha descoberto por inteiro. São os que gosto mais porque são a excepção, e eu adoro excepções. O mestre máximo da poesia sensacionista, o paganismo em pessoa, o que afirma que pensar é estar doente dos olhos: de repente, só pensa nela. E toda a realidade olha para ele como um girassol com a cara dela no meio. Se isto não é uma das coisas mais bonitas que foram escritas, o que é? Como disse, não descobri ainda por inteiro todos os significados que estes poemas me têm, primeiro porque ainda não morri, nem planeio fazê-lo a curto/médio prazo. Depois porque como disse, e bem, o poeta-zarolho: «segundo o amor tiverdes/Tereis o entendimento dos meus versos.». Olha acontece que hoje reparei numa coisa que ainda não tinha atingido plenamente. «Doente» pode ser, segundo a gramática do português e entre outras coisas, a conjugação do verbo «doer» no particípio presente, o ser doente é aquele que dói, é encarnar em nós o verbo «doer», dar forma à dor, isto que pensei ainda torna tudo mais bonito... e mais doente.

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